Dia 22 de maio (domingo) é o Dia do Autor Português.
Aqui ficam excertos de alguns dos nossos autores. Os livros estão, como sempre, à sua espera, na Biblioteca Escolar!
Aqui ficam excertos de alguns dos nossos autores. Os livros estão, como sempre, à sua espera, na Biblioteca Escolar!
O que é que um Douradinho tem a
ver com Os Lusíadas? O Capitão Iglo é
um sex symbol?
Capitão
Iglo
O Douradinho foi uma das grandes invenções
da década de 80. (…) O Douradinho estava para o peixe normal como as adaptações
em banda desenhada de Os Lusíadas
estavam para Os Lusíadas originais.
Nós preferíamos a adaptação. Tinha bonecos. No caso dos Douradinhos, não tinham
bonecos – mas também não tinham espinhas. (…)
No seu primeiro e famoso anúncio
televisivo, o Capitão Iglo passeava-se pelo seu navio, cuja tripulação era totalmente
composta por miúdos de várias idades. Hoje olhamos para aquilo e vemos trabalho
infantil – raça do velho lobo do mar! – mas, na altura, olhávamos com inveja
para aqueles moços, felizes e orgulhosos de passarem à esfregona o chão que o
Capitão Iglo pisava. (…)
Em tempos mais recentes, o Capitão Iglo
mudou – ficou mais jovem, de cabelo preto, perdeu a barba, ganhou ar de sex symbol e deixou de ser um capitão de
navio old school para dirigir uma
embarcação ali a pender para Ficção Científica. Isto entristece-me – o Capitão
Iglo quer-se velhinho, contador de histórias e inofensivo. Este novo Capitão
Iglo de certeza que não hesita em deixar de vigiar os miúdos para engatar
mulheres, e isso é imperdoável.
Nuno Markl. Caderneta de Cromos Contra-Ataca. Carnaxide: Editora Objetiva,
2011.
Espelho meu, espelho meu: há
alguém mais… feio do que eu? Como diz o povo, santa ignorância…
O espelho
único
MÃE DE MARIA: Se não era fogo,
porque me acordaste?
MARIA: Porque o meu marido é um
velhaco, um biltre, um falsário, um arrenegado.
MÃE DE MARIA: E acordas-me tu só
por isso?
MARIA (chora): Anda a trair-me com outra.
MÃE DE MARIA: Ai anda? Grande
traste. E quem é a pécora?
MARIA (choramingando): Está ali. (Aponta
para o embrulho)
MÃE DE MARIA: Ali? Onde?
MARIA: O retrato dela. Calcule,
mãe, que o Narciso teve o descaramento de trazer o retrato dela para casa. (Chora mais)
Mãe
de Maria acolhe a filha nos braços e conforta-a.
MARIA (chorando): Só queria que mãe visse a feiosa que ela é, toda mal
pronta e esguedelhada. Uma indecência de mulher.
MÃE DE MARIA (consolando-a): Deixa estar, filha, que eu vou ver e, se for como
tu dizes, a gente dá uma desanda no teu marido, ai uma desanda…
A
Mãe de Maria vai pegar no espelho.
MÃE DE MARIA (fixando
o espelho, aterrorizada): Ai que velha avantesma!
António Torrado. Era uma Vez Quatro. Lisboa: Caminho,
2007.
Sabem por que razão o nosso
prémio Nobel da Literatura tem o apelido «Saramago»? E conhecem algum caso de
um filho que tenha dado o nome ao pai?
Pequenas
Memórias
Contei noutro lugar como e porquê me chamo
Saramago. Que esse Saramago não era um apelido do lado paterno, mas sim a
alcunha por que a família era conhecida na aldeia. Que indo o meu pai a
declarar no registo Civil da Golegã o nascimento do seu segundo filho, sucedeu
que o funcionário (chamava-se ele Silvino) estava bêbado (por despeito, disso o
acusaria sempre meu pai), e que, sob os efeitos do álcool e sem que ninguém se
tivesse apercebido da onomástica fraude, decidiu, por sua conta e risco,
acrescentar Saramago ao lacónico José de Sousa que me pai pretendia que eu
fosse. E que, desta maneira, finalmente, graças a uma intervenção por todas as
mostras divina, refiro-me, claro está, a Baco, deus do vinho e daqueles que se
excedem a bebê-lo, não precisei de inventar um pseudónimo para, futuro havendo,
assinar os meus livros. (…) Mas o pior de tudo foi quando, chamando-se ele
unicamente José de Sousa, como ver se podia nos seus papéis, a Lei, severa,
desconfiada, quis saber por que bulas tinha ele então um filho cujo nome
completo era José de Sousa Saramago. Assim, intimado, e para que tudo ficasse
no próprio, no são e no honesto, meu pai não teve outro remédio que proceder a uma
nova inscrição do seu nome, passando a chamar-se, ele também, José de Sousa
Saramago. Suponho que deverá ter sido este o único caso, na história da
humanidade, em que foi o filho a dar o nome ao pai.
José Saramago. As Pequenas Memórias. Lisboa: Caminho, 2006.
O que «cabe» na poesia?
SEGREDO + SORRISO + MANJERICO + LARANJA = AMOR
Tenho um segredo
a dizer-te
Que não te posso dizer.
E com isto já t’o disse
Estavas farta de o saber…
Dá-me um sorriso
a brincar,
Dá-me uma palavra a rir.
Eu me tenho por feliz
Só de te ver e te ouvir.
Manjerico, manjerico,
Manjerico que te dei –
A tristeza com que fico,
Inda amanhã a terei.
Caiu no chão a laranja
E rolou pelo chão fora.
Vamos apanhá-la juntos,
E o melhor é ser agora.
Fernando Pessoa. Quadras. Lisboa: Assírio & Alvim,
2002.
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